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“Uma Ideia Genial” é vaudeville sobre ciúme com elenco liderado por Cássio Gabus Mendes

Sucesso com “Toc Toc”, o diretor Alexandre Reinecke estreia nova comédia francesa e garante que os dramaturgos do país de Molière e Feydeau são os melhores devido a uma tradição que se renova

Por Dirceu Alves Jr.

O ator francês Sébastien Castro, de 49 anos, fez sucesso nos palcos parisienses em peças conhecidas do público em versão brasileira, como O Avarento, de Molière, O Vison Voador, de Ray Cooney e John Chapman, e O Nome do Bebê, de Matthieu Delaporte e Alexandre de la Patellière. De sua lavra como dramaturgo, Uma Ideia Genial é um fenômeno desde o lançamento, em 2022. Vista por 300 mil espectadores em 400 apresentações, a comédia venceu dois prêmios Molière e ganhou adaptações em vários países. Chegou a vez de o Brasil conhecer o texto, um genuíno vaudeville, como manda a tradição francesa.

Sob a direção de Alexandre Reinecke, Uma Ideia Genial estreia no Teatro Procópio Ferreira nesta sexta, 24, com um elenco craque no gênero formado por Ary França, Cássio Gabus Mendes, Suzy Rêgo e Zezeh Barbosa. Típica comédia de erros, a peça traz a história de Arnaud e Marion (vividos por Gabus Mendes e Suzy), um casal que, para driblar a falada crise dos sete anos, pensa que mudar de endereço pode ser uma boa solução. 

O elenco de Uma Ideia Genial. Foto Bruno Lemos

Os dois decidem deixar a casa nos arredores de Paris para morar em um bairro central da capital e, ao contratar um corretor (papel de França), a crise entre eles se intensifica. O ciumento Arnaud acredita que Marion se interessou pelo responsável por lhe mostrar as opções de locação e, um dia, no metrô, cruza com um homem idêntico ao corretor, que, na verdade, é um ator canastrão. Confiante de que teve a tal ideia genial, ele contrata o sujeito para se passar pelo outro e começar a destratar sua mulher, que, assim, se desinteressaria do possível amante. A entrada em cena de uma vizinha, Catherine (representada por Zezeh) detona confusões das quais ninguém escapa ileso.

“Eu acho que vai dar certo e o público deve gostar, como tem gostado de Toc Toc”, aposta Reinecke, que, desde meados da década de 2000, se firmou como um dos principais diretores de comédia do teatro brasileiro. Ele vive uma fase de pura felicidade, graças à ótima aceitação de Toc Toc, texto de Laurent Baffie, dirigido por ele em 2008, que voltou repaginado no ano passado. Entre outubro e dezembro, a nova versão, com André Gonçalves, Cláudia Ohana e Riba Carlovich, entre outros, levou 20 mil espectadores ao Teatro Procópio Ferreira e, a partir desta sexta, 24, se transfere para o Teatro das Artes, no Shopping Eldorado.

Além do bom humor, Toc Toc e Uma Ideia Genial são escritas por autores franceses contemporâneos e, segundo o diretor, esta é uma garantia de qualidade. “Eles estão mil anos à frente de nós porque existe uma tradição francesa de comédia que vai de Molière (1622-1673), passa por Georges Feydeau (1862-1921) e permanece viva até a atualidade”, justifica. “É bem diferente do resto do mundo, onde os autores são mais ligados ao drama e as gerações de comediógrafos não se renovam.”

Cassio Gabus Mendes, Suzy Rêgo, Ary França e Zezeh Barbosa em Uma Ideia Genial. Foto Bruno Lemos

Reinecke saliente que mesmo no Brasil, que tem uma escola de comédia iniciada por Martins Pena (1815-1848), o gênero vive de tempos em tempos um auge e, depois, esfria novamente. “Nas décadas de 1980 e 1990, tivemos uma explosão com as peças de Juca de Oliveira e a parceria de Marcos Caruso e Jandira Martini, mas, hoje, a gente não sabe a quem recorrer quando procura um bom texto”, comenta. “O Leonardo Cortez, autor das recentes Pousada Refúgio e Veraneio, é bom, mas ainda teve a chance de conhecer um verdadeiro sucesso popular.”

A dramaturgia, claro, é importante, mas Reinecke reconhece que para arrancar as gargalhadas da plateia é fundamental a reunião de atores e atrizes talentosos. Ary França, que se desdobra em cinco personagens, é um velho parceiro do encenador e conta com a sua admiração há mais de 25 anos. “Nós contracenamos em O que o Mordomo Viu?, em 1999, quando eu ainda atuava, e ali desisti de ser ator”, brinca. “Depois, como diretor, Ary esteve comigo em quatro ou cinco peças, nem me lembro, como Arsênico e Alfazema, O Estrangeiro e O Santo e a Porca, e sei que o que ele faz em Uma Ideia Genial é muito puxado, exigente, difícil mesmo para qualquer intérprete.”

Com Suzy Rêgo, Reinecke trabalhou em Meu Filho Vai Casar, em 2018, e a escalação de Cássio Gabus Mendes para o papel de Arnaud é a concretização de um desejo acalentado há tempos, mas que sempre esbarrava nos compromissos do ator na televisão. Reinecke se aproximou de Gabus Mendes por intermédio de irmão dele, o também ator Tato Gabus Mendes, que participou de duas de suas peças, Arte e Adorei o que Você Fez, na década de 2000. “O Cássio é um príncipe, um cara de uma gentileza sem fim e, por causa daquelas coisas inexplicáveis, não fazia teatro há 30 anos”, declara. 

Elenco da peça Uma Ideia Genial ao lado do produtor Sandro Chaim e com o diretor Alexandre Reinecke. Foto: Bruno Poletti

A última investida nos palcos do intérprete, que construiu em quatro décadas uma carreira consagradora na televisão, foi o espetáculo Parzifal, dirigido por Jorge Takla em 1992. Ele dividia a cena com Lídia Brondi, sua mulher até hoje, que, na época, ainda era atriz, Elias Andreato, Chico Martins e Mara Carvalho.

Quem também trabalha pela primeira vez com Reinecke é Zezeh Barbosa. A comediante paulista, formada pela Escola de Arte Dramática (EAD), começou nas montagens do Circo Grafitti na virada dos anos de 1980 e ganhou destaque em O Mambembe, encenação de Gabriel Villela no Teatro do Sesi, em 1996. A popularidade veio através das novelas da Rede Globo, entre elas Salsa e Merengue, A Lua me Disse e a recente Todas as Flores. “A Zezeh faz a personagem que mais causa e confunde a trama, é o respiro em meio a toda a tensão do vaudeville”, explica o diretor.

Aos 61 anos, a atriz voltou a morar em São Paulo há quatro meses depois de mais de duas décadas no Rio de Janeiro, e Uma Ideia Genial marca também o retorno ao teatro. O seu último espetáculo foi o musical Lapinha, apresentado no Rio de Janeiro em 2014. “Eu sou muito grata à televisão porque, graças a ela, me calcei, comprei casa, criei meu filho, mas o teatro me vinga porque aqui eu realmente faço o que quero”, afirma Zezeh.

Para ela, Catherine, sua personagem, é, apesar de casada, uma mulher livre e acumula cenas divertidas com o ator Ary França na nova montagem. “Estou junto de um elenco maravilhoso e, acima de tudo bem-humorado, porque sou uma pessoa bem-humorada e o público percebe essa diferença na hora em que assiste a um espetáculo”, diz. “Eu não entendo como um ator ou uma atriz que não valoriza o humor na vida pode querer fazer comédia, não tem como dar certo porque a plateia se sente enganada, não tem jeito.”  

Serviço

Uma Ideia Genial.

Teatro Procópio Ferreira. Rua Augusta, 2823, Jardim Paulista.

Sexta, 21h; sábado, 21h30; domingo, 18h30. R$ 60 / R$ 140

Até 27 de abril (estreia 24 de janeiro)

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Dirceu Alves Jr

Jornalista, escritor e crítico de teatro, trabalhou em Zero Hora, IstoÉ Gente e Veja São Paulo e publicou os livros Elias Andreato, A Máscara do Improvável (Humana Letra) e Sérgio Mamberti, Senhor do Meu Tempo (Edições Sesc).
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