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Martha Nowill discute o abandono na maternidade no solo “Renda-se”

Sinopse

Texto da inglesa Sophie Swithinbank, dirigido por Fernanda D’Umbra, traz o reencontro de uma mãe e a filha no Sesc Ipiranga

Por Dirceu Alves Jr. (publicada em 13 de junho de 2025)

No fim de 2022, a atriz Martha Nowill, de 44 anos, estreou o monólogo Pagu – Até Onde Chega a Sonda, roteirizado por ela mesma com base em manuscritos da escritora e militante colunista redigidos na prisão, em 1939. Em meio aos depoimentos de Patrícia Galvão (1910-1962) sobre o autoritarismo e pressões machistas, a atriz se identificou especialmente com a dor da mãe, que sofria com a saudade de Rudá, seu filho com o escritor Oswald de Andrade (1890-1954). 

Martha, na época, tinha acabado de dar à luz os gêmeos Benjamin e Maximilian, hoje com 4 anos, e, numa linha autoficcional, o solo, dirigido por Elias Andreato, era costurado por suas reflexões em relação à maternidade e ao novo cotidiano ligado às crianças. “Foi um projeto forte que só tive coragem de colocá-lo em prática depois que tive meus filhos”, conta. “A gestação e o puerpério me levaram a lugares sombrios que me fizeram amadurecer e perder o medo de me desafiar, até para ganhar dinheiro.”

Martha Nowill no solo Renda-se. Foto Edson Kumasaka

Se em Pagu – Até Onde Chega a Sonda, Martha abraçou quase todas as tarefas – idealizou, escreveu, produziu e protagonizou –, o seu novo espetáculo, Renda-se, um outro solo, escrito pela dramaturga inglesa Sophie Swithinbank, caiu em seu colo. O convite para a montagem, que estreia nesta sexta, 13, no Auditório do Sesc Ipiranga, chegou através da diretora Fernanda D’Umbra. Martha, apanhada de surpresa, questionou se valeria investir em um novo monólogo norteado pelo mesmo tema: a maternidade.

Foi só ler o texto para que as dúvidas todas fossem dissipadas. “A pontuação é tão boa que, pela primeira vez, não ouso acrescentar um caco sequer”, elogia. “A personagem fala, gagueja, repete as palavras, tem mil reticências e vai além de tudo o que já fiz.” 

As angústias da mãe que protagoniza a história criada por Sophie Swithinbank passam bem longe dos dilemas que atingiram Martha ou Pagu. Presa há 12 anos, a personagem recebe a visita da filha que não vê desde os quatro meses. Ela trabalhava em um escritório e, nas horas livres, investia na sonhada carreira de atriz em busca de alguma chance que a tirasse do anonimato. Não contava com o apoio de mãe, marido ou amigos e, devido ao sono inconstante do bebê, atravessou meses sem dormir – o que a levou a um colapso nervoso que a fez perder a filha. 

Sim, no ápice de uma crise, essa mãe fragilizada se esqueceu do paradeiro da menina só encontrada muitos dias depois. A justiça, ao invés de ampará-la ou oferecer um tratamento médico, a colocou atrás das grades, entregando o bebê para pais adotivos. 

Outra cena com Martha Nowill no solo Renda-se. Foto Edson Kumasaka

Agora, diante da filha adolescente, é hora de a protagonista dar a sua versão sobre os atos que culminaram em sua detenção. É como se a cabeça da personagem, indo e voltando no tempo, conduzisse a dramaturgia

Martha se angustia só de pensar no drama da mãe que vive na ficção. “É uma realidade tão diferente da minha, mas eu entendo perfeitamente o que pode ter levado essa mulher ao esgotamento”, diz. “A maternidade é uma das experiências mais lindas do mundo, mas precisamos tratá-la sem um excesso de romantismo até para lidar melhor com a rotina que não é leve.”

A artista tem investido no seu lugar de fala para colocar o tema pouco debatido de uma forma realista na roda. Em março, Martha publicou o livro Coisas Importantes Também Serão Esquecidas (Companhia das Letras, 224 págs. R$ 89,90), um diário franco – e, por vezes, divertido – sobre as diversas etapas da gestação e do puerpério cercada de dúvidas e temores agravados pela pandemia. 

“Faço parte de uma geração que batalha para equalizar os papéis de mãe e pai, e o meu marido é tão presente quanto eu”, afirma ela, referindo-se ao publicitário Luiz Braga. “Mas reparação dá trabalho e seria mais simples eu assumir tudo sozinha até por uma questão cultural, só que, felizmente, não é o que ele quer.”

Cena do solo Renda-se, com Martha Nowill. Foto Edson Kumasaka

Como se não bastasse os preparativos de Renda-se e os cuidados com os dois meninos, Martha encontrou tempo para estrear como diretora em outro monólogo, A Autoestima do Homem Hétero. A peça cômica, criada e protagonizada pela atriz Amanda Mirásci, entra em cartaz em 5 de julho no Teatro Uol, no Shopping Pátio Higienópolis. 

“Era para ser mais adiante e, quando fechou a pauta, eu fiquei naquela de ‘posso, não posso’, mas o fato é que ensaio uma peça de manhã, outra à tarde e seguimos em frente”, diz. “Tudo o que acontece faz sentido porque ser dirigida por uma atriz enquanto eu dirijo uma colega em um outro solo me faz saber exatamente o que ela sente ou quer falar durante o processo.”

Uma nova investida como encenadora não é descartada. Martha parece feliz com a experiência de A Autoestima do Homem Hétero. “Eu descobri que nasci para mandar e gostei de dirigir”, brinca. “É bom fazer as coisas com maturidade porque estou no teatro desde os 17 anos e vejo que alguma coisa já aprendi.”

Serviço

Renda-se

Auditório do Sesc Ipiranga. Rua Bom Pastor, 822, Ipiranga.

Sexta, 21h30. Sábado, domingo e feriado, 18h30. R$ 50.

Até 6 de julho (estreia 13 de junho)

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Ficha Técnica

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Serviço

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