Montagem em cartaz no Teatro Sérgio Cardoso mantém o humor da exuberante e maliciosa sátira de Hollywood do final dos anos 1920
Por Ubiratan Brasil
Cantando na Chuva sempre figurou na lista dos maiores musicais já produzidos em Hollywood – na maioria das vezes, na primeira posição. E motivos não faltam: além de um roteiro (assinado por Betty Comden e Adolph Green) muito bem traçado, com equilíbrio perfeito entre comédia e drama, o longa de 1952 dirigido por Stanley Donen e Gene Kelly traz coreografias que se tornaram clássicas – a começar pela que acompanha a apresentação da canção título.
São muitos, portanto, os desafios para levar o filme para o palco teatral. No Brasil, Claudia Raia e Jarbas Homem de Mello comandaram uma bem sucedida produção em 2017 e agora chega uma nova versão, já em cartaz no Teatro Sergio Cardoso.
Com produção do Instituto Artium de Cultura e coprodução do Atelier de Cultura, a montagem não apenas vence os principais desafios como traz um frescor para uma trama já conhecida. “Com certeza quem já conhece o filme vai se encantar mais ainda com esta nova produção. Quem ainda não conhece, terá uma experiência recheada de grandes referências da década que mudou o mundo do ponto de vista tecnológico e artístico. A nova versão tem muito mais comédia, coreografias e glamour”, comenta John Stefaniuk, diretor da produção.
A trama acompanha as estrelas do cinema mudo Don Lockwood (Rodrigo Garcia) e Lina Lamont (Fefe Muniz ) que fazem sucesso com todos os filmes lançados. A imprensa de fofocas até alimenta um romance entre eles, sempre desmentido por Don, que despreza sua colega de set. A fama da dupla é ameaçada, porém, com a chegada do cinema falado: O Cantor de Jazz, lançado pela Warner naquele ano de 1927, traz a novidade de um ator falando e cantando.
Os magnatas do cinema inicialmente ignoram a novidade, acreditando ser algo passageiro, mas o sucesso do longa com Al Johnson promove uma revolução nos estúdios, com os filmes mudos sendo rapidamente trocados pelos falados. O problema é que Lina tem uma voz sofrível, provocando gargalhadas na plateia nas sessões de pré-estreia. A solução é encontrada por Cosmo Brown (Mateus Ribeiro), melhor amigo de Don, que sugere que a voz de Lina seja encoberta pela da Kathy Selden (Gigi Debei), atriz por quem Don se apaixona.
“Kathy é uma atriz que não se interessa pelo cinema mudo porque, por atuar no teatro, ela sabe da importância da voz”, conta Gigi, que alterna com elegância o descaso. “Hollywood só entra no seu interesse justamente com a chegada do cinema falado.”
Já o desafio de Fefe Muniz foi o de construir uma personagem com voz esganiçada. “Primeiro tive de aprender como fazer o certo, especialmente nas canções, para então desconstruir tudo”, conta ela que, no período de preparação, teve ainda de lutar contra uma doença que deixou enfraquecida. O esforço, porém, foi recompensador, com uma bela atuação.
Também maravilhosa interpretação oferece Mateus Ribeiro que, como o talentoso mas eternamente secundário Cosmo, exibe um perfeito timing do humor, tornando-se um dos preferidos do público. “Busquei muita inspiração na atuação de Donald O’Connor, que vive o personagem no filme”, conta ele, que também exibe técnica e habilidade para apresentar o grande número de Cosmo, Make ‘Em Laugh, em que sapateia e tem intensa movimentação. “É um momento em que ‘contraceno’ com objetos, como escada, balde, e tudo precisa estar no lugar certo para o número ser um sucesso.”
O grande momento, porém, é protagonizado por Rodrigo Garcia e seu canto e dança na chuva. “Assisti muitas vezes à cena do filme, estudando a movimentação e a dança do Gene Kelly“, conta o ator, que dança sobre a chuva que cai no palco. “Não foi para imitar, mas para ter um conhecimento prévio do que posso fazer em cena.” Kelly, aliás, teve de gravar mesmo sofrendo com uma febre de 39 graus. E a água usada na cena fez com que o terno de lã do ator encolhesse durante as filmagens.
A habilidade do elenco no sapateado é comprovada em diversas cenas, como na coreografia apresentada no também clássico número de Bom Dia, envolvendo Don, Kathy e Cosmo. “Nessa peça, o sapateado é um instrumento musical”, comenta Rodrigo. De fato, a atriz Debbie Reynolds, que vive Kathy no cinema, fez um comentário decisivo sobre o desafio: “Cantando na Chuva e dar à luz foram as duas coisas mais difíceis que já tive que fazer na minha vida”.
Serviço
Cantando na Chuva
Teatro Sérgio Cardoso. R. Rui Barbosa, 153
Quarta à sexta-feira, 20h. Sábado e domingo, 15h e 19h30. R$19,80 a R$ 400
Patrocínio master da Brasilprev, patrocínio do Sem Parar e apoio do Radisson Blu São Paulo e da Dona Deôla.
Até 16 de junho