“Elagalinha”, fábula musical juvenil de Marcelo Romagnoli, com a Cia. Bendita, está de volta ainda mais atual ao tratar de um assunto ainda sob discussão: educação como prática de liberdade
Por Dib Carneiro Neto
“A cabeça aprende, mas quem ensina é o coração.” Esse verso incrível e sábio é cantado na abertura – e depois repetido na canção final, como síntese do espetáculo. Trata-se de Elagalinha, voltando a fazer temporada em São Paulo, desta vez nas unidades dos CEUs (mas com sessões também abertas ao público), cumprindo a circulação do Prêmio José Renato.
Com música ao vivo, a montagem é encenada pela Cia Bendita, fechando uma trilogia que inclui outros dois sucessos do grupo, Terremota e Gagá. Os três são de autoria de ninguém menos do que Marcelo Romagnoli. Escrito em 2018, Elagalinha é o 22° texto para teatro jovem escrito por ele – e foi lançado em livro pela Editora Patuá na estreia da peça em 2019, quando o espetáculo ganhou o Troféu APCA de melhor espetáculo infantojuvenil de rua.
Conta a história do primeiro dia de aula de uma galinha de 6 anos de idade, presa em uma jaula-galinheiro pelo vilão Elemonstro, um homem cheio dos piores instintos animais. A pequena Elagalinha faz dessa prisão sua sala de aula, tentando ensinar civilidade e cidadania ao vilão. Com referências próprias do gênero literário chamado de fábula, a peça aborda a eterna crise das relações entre fortes e fracos, adultos e crianças, novo e velho. Mas o foco é a Educação, a partir de muitos conceitos do educador Paulo Freire, como a educação como prática de liberdade.
O melhor e o pior da civilização
Por que a vida escolar é um assunto que ainda rende tanto como tema no teatro? Romagnoli, que também assina a direção do espetáculo, responde com exclusividade para o Canal MF: “Talvez porque essa ‘vida’, paralela à outra, é uma marca na personalidade de cada um de nós e que ainda precisa ser filtrada. Talvez porque a escola é a primeira incursão da criança na sociedade, num campo de regras, deveres e expectativas, um verdadeiro tabuleiro de batalha onde se aprende o que é, de fato, o mundo que prepararam pra gente. E talvez porque a escola, em geral, seja o reflexo do que a civilização tem de melhor e pior”.
O autor e diretor da peça também comenta por que é importante continuar encenando Elagalinha. Ele diz: “Porque, como está no texto da peça, seu assunto ainda não está resolvido”. Para ele, sua peça está cada vez mais atual e o galinheiro, escolhido como espaço principal da trama, é “metáfora não apenas da sala de aula e de suas relações de poder e amor, trocas e ajustes, mas também é uma crítica política, social e, sobretudo, uma observação sobre as relações entre o universo adulto e a infância”. Ele prossegue: “Tudo para dizer que se a sociedade ouvisse mais a criança e deixasse a educação emocional assumir um papel maior dentro da pedagogia de base, teríamos um cidadão melhor e mais preparado para a verdadeira revolução que o planeta precisa antes do fim”.
Um jeito de representar a mente que julga
Uma curiosidade de Elagalinha é que há críticos de teatro em cena, como personagens, e isso resulta, no mínimo, muito divertido. Romagnoli comenta: “Os Críticos da peça são uma brincadeira com o metateatro. Mas sua função real é representar a mente – interna e externa – que julga, analisa e cria regras de comportamento, muitas vezes de forma autoritária”.
Romagnoli tem outras peças recentes sobre escola/educação, como Napoleão e Eduka. Talvez seja sua inquietação mais incômoda atualmente, como cidadão e como artista. Mas ele retruca: ”Acho que minha inquietação é o mundo que vejo pela janela.” E arremata: “Acho que todas as formas de educação têm seu valor, quando amparadas na essência do amor e da liberdade. Difícil mesmo é definir o que é amor e liberdade. Conceitos completamente diferentes para os personagens da peça Elagalinha, por exemplo. Para Paigalo, ex galo de briga, amor e liberdade são bens conquistados por meio da luta; para Elemonstro, são resultado do livre mercado e do trabalho. Para Elagalinha, quem comanda tudo é o coração e pronto.”
Para dar conta de todos esses assuntos em sala de aula, os professores ganham da Cia Bendita, nesta temporada, um caderno pedagógico com sugestões de pontos e formas de abordagem.
Serviço
CEU PARAISÓPOLIS:
Rua Dr Jose Augusto de Souza e Silva, s/n – Jardim Parque Morumbi, tel. 11 3747-1950
26/02/24 – 1 apresentação aberta ao público às 14 h com libras
27/02/24 – 1 apresentação às 10 h e 1 apresentação às 14 h – escolas
CENTRO CULTURAL – VILA FORMOSA:
Avenida Renata, 163 , Chácara Belenzinho, tel. (11) 2216-1520
15/03/24 – 1 apresentação às 10 h e 1 apresentação às 14 h – escolas
17/03/24 – 1 apresentação às 15 h aberta ao público com libras
CEU CAPÃO REDONDO:
Rua Daniel Gran, s/n – Jardim Modelo, tel. 11 5874-9836
22/03 – 1 apresentação aberta ao público/EJA às 19h30
25/03 – 1 apresentação às 10 h e 1 apresentação às 15 h. (as duas com intérprete de libras) – escolas