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Carol Duarte estreia o monólogo “A Visita” na busca constante do discurso como atriz

Sinopse

Sob a direção de Murillo Basso, a artista interpreta uma decadente figura da elite enraizada em conceitos ultrapassados

Por Dirceu Alves Jr.

Em 2017, a atriz paulista Carol Duarte, então com 26 anos, alcançou o feito de ganhar fama e reconhecimento em seu primeiro trabalho na televisão. Na novela A Força do Querer, escrita por Glória Perez para a Rede Globo, ela interpretou Ivana, jovem da classe alta carioca que se entende como um garoto transexual, e o personagem gerou uma relevante discussão entre os telespectadores.

Com uma maturidade incomum entre os artistas de sua geração, Carol entendeu que aquela era uma hora definidora da sua identidade profissional. Protagonizou, na sequência, o premiado filme A Vida Invisível, de Karim Aïnouz, voltou à Globo para a novela O Sétimo Guardião e, no ano passado, rodou La Chimera, produção italiana, dirigida por Alice Rohrwacher, que, assim como A Vida Invisível, estreou no Festival de Cannes. Carol, entretanto, aos 32 anos, sabe que a vida de artista não é feita de tapetes vermelhos e se concentra na densidade dos personagens que chegam até as suas mãos.

Carol Duarte no monólogo A Visita. Foto Murillo Basso

A atriz encerrou, no domingo, dia 19, a temporada do espetáculo de Babilônia Tropical – A Nostalgia do Açúcar, dirigido por Marcos Damigo, depois de cem apresentações, que, antes de São Paulo, se realizaram em Belo Horizonte, Brasília e Rio de Janeiro. Em cena, viveu Anna Paes, uma dona de engenho do século XVII que explica muitas coisas em torno das barbáries perpetuadas na história brasileira.

Na manhã seguinte, dia 20, feriado do Dia da Consciência Negra, Carol entrava no Sesc Belenzinho para dar sequência aos ensaios de A Visita, o seu primeiro monólogo, que estreia na sexta, dia 24, sob a direção de Murillo Basso. “Não vai ter descanso, mas isso me dá uma imensa alegria”, afirma ela, ao telefone, por volta das 9h, sem disfarçar o entusiasmo na voz. Basso até brincou com a puxada rotina de sua protagonista: “Queria ter dado esse dia de folga para ela, mas não rolou, temos muitos detalhes para resolver”.

Escrito pela editora, tradutora e professora Aline Klein, A Visita é centrado em uma figura feminina sem nome e de idade indefinida – pode ter 28, 48 ou 75 anos. “E isso não é bom porque ela reproduz um discurso típico da elite paulistana que vimos muitos nos últimos anos e consiste na necessidade de preservar os próprios valores”, aponta Carol. Em um pequeno apartamento, a conservadora personagem finge manter um padrão social perdido há tempos e, em uma dimensão tragicômica, recebe uma inesperada visita para quem insiste em alimentar o status do passado.

Cena de A Visita, monólogo com Carol Duarte Foto Murillo Basso

“Ela é uma tradução de pessoas como aquelas que lutaram contra a implantação de uma estação de metrô em Higienópolis”, define. “É movida por raiva, ressentimento e desespero dos que acreditam na fantasmagoria do comunismo e bem que poderia estar entre aqueles que no dia 8 de janeiro foram até Brasília destruir o patrimônio público.”   

No centro do palco, Carol aparece presa pelos pés a uma plataforma, não sai do lugar, como se estivesse enraizada no chão e nada pode fazê-la se mover dali. “O que se vê é uma figura que ganha vida pela gestualidade e, em seus delírios, sonha que é uma árvore centenária, um jacarandá”, explica Basso. Essa radical decisão de imobilizar a atriz representa a dificuldade de certos indivíduos aceitarem mudanças. “Ela não tem mais dinheiro, mal consegue pagar o condomínio, mas diz coisas como ‘ninguém olha para a Europa como eu’ e quer pisar no Brasil que julga inferior a ela”, acrescenta a atriz.

Carol assume que pode ter tido sorte em sua trajetória curta e consistente – estava disponível para convites que apareceram em horas oportunas. “O trabalho de um ator e de uma atriz é entender o seu tempo e o seu espaço e o que pode fazer a partir disto”, comenta.

Para ela, criar uma personagem é elaborar a época que se vive e apresentar essa pessoa com pontos críticos que se comuniquem com o público. Isso vale para a Ivana de A Força do Querer, para os filmes de que participou e, principalmente, para as escolhas teatrais deste ano. “Tive que dizer não para um projeto de audiovisual bacana e que me renderia um bom dinheiro porque queria voltar ao palco e recuperar um pouco dessa minha essência”, declara.

Disciplina no cinema

Depois de passar seis meses na Itália envolvida com La Chimera, a artista emendou as filmagens de Malu, longa de Pedro Freire, cinebiografia sobre a atriz Malu Rocha (1947-2013), em que contracenou com Yara de Novaes e Juliana Carneiro da Cunha. “No cinema, você faz parte de um todo imenso e significa uma disciplina enorme, distância de casa e um tchau para a família, enquanto, no teatro, fico com os meus e a narrativa, de certa forma, está comigo”, compara.

Para Carol, A Visita é um projeto pessoal e afetuoso. Basso é amigo desde quando os dois estudavam na Escola de Arte Dramática (EAD) e Aline Klein, sua parceira de vida e, agora, de arte. “Foi uma ideia que construímos na fase mais árdua da pandemia, já que, nesta época, todos nós morávamos no Edifício Copan e nós nos juntávamos para criar e pensar um pouco sobre os horrores daquele projeto de país pregado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro”, conta.

A atriz reconhece todas as dificuldades para manter a coerência como artista no Brasil e que uma profissional se firma de acordo com as escolhas. “A Força do Querer foi incrível para a minha formação, La Chimera representou algo muito especial, contracenei com Isabella Rossellini, mas desde que vi Fernanda Montenegro nervosa antes de rodar as primeiras cenas de A Vida Invisível entendi que o jogo nunca está ganho”, completa Carol, pronta para começar o ensaio em uma manhã de feriado e se jogar no palco com o máximo de preparo possível.

Serviço

A Visita.

Sesc Belenzinho – Sala de Espetáculos 1. Rua Padre Adelino, 1000, Belenzinho.

Sexta e sábado, 21h30; domingo, 18h30. R$ 40.

Até 17 de dezembro.

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Ficha Técnica

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Serviço

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