Com texto original e direção de Marcio Abreu, “Ao Vivo [dentro da cabeça de alguém]”, nova investigação da companhia brasileira de teatro, convida o público a olhar para histórias singulares e coletivas da sociedade brasileira
Por Ubiratan Brasil
Em 1974, a atriz Renata Sorrah passou no disputado teste para o papel de Nina, da peça A Gaivota, de Tchekhov. A expectativa era de uma grande montagem no Rio, estrelada ainda por Tereza Rachel, Sérgio Britto e Cecil Thiré. Mesmo assim, Renata não se sentia à vontade com o trabalho. “Fiquei pensando em desculpas para não fazer porque não compreendia a profundidade do projeto. Até que um certo dia, dirigindo na região da Urca, tive um estalo e entendi toda a importância da obra de Tchekhov e as questões científicas e sociais que ele propôs e que ainda são atuais”, conta a atriz, enfim integrada à montagem.
Ao ouvir tal história, Márcio Abreu, encenador com quem ela trabalha há muitos anos na companhia brasileira de teatro, descobriu o fio da meada para o novo espetáculo, Ao Vivo [dentro da cabeça de alguém], que estreia no dia 22 de agosto no Teatro do Sesi-SP, com ingressos gratuitos. A partir da trajetória artística de Renata Sorrah, a narrativa da peça é formada por diferentes elementos de diversos campos de memória dos artistas que o compõem.
“O público é convidado a percorrer uma lógica de sonho ou de memória, não exatamente no sentido onírico, mas como a gente formula o pensamento, como a memória não tem só a ver com o passado, mas como é um campo ativo de produção de sentidos e também de projeção para possíveis futuros”, explica Marcio Abreu.
Como sempre acontece em suas peças, o trabalho é colaborativo e aqui constam as assinaturas de Rodrigo Bolzan, Rafael Bacelar, Bárbara Arakaki e Bianca Manicongo, além da própria Renata Sorrah. E, durante o processo de criação a partir da obra do autor russo, certos questionamentos nasceram durante a criação da dramaturgia, como: quais questões levantadas por Tchekhov atravessam o tempo e chegam até nós, hoje? E de que modo? Como expandir essas questões? E que formas são possíveis, hoje? Há formas novas, futuros possíveis?
“Quando entramos na cabeça de alguém, no campo dinâmico de produção de memória, percebemos que a vida de um único sujeito não é formada apenas por uma individualidade, mas por uma multidão de possibilidades de ser”, continua o diretor. “É uma peça sobre estar vivo agora. É uma espécie de ensaio sobre vivências no tempo, sobre como colocar tempos múltiplos em relação, no presente. Os tempos – histórico, subjetivo, futuro e da memória – estão todos em convivência.”
Renata lembra de momentos gloriosos em sua carreira, como a participação na já clássica montagem de Lágrimas Amargas de Petra von Kant, de 1982, quando dividiu o palco com Fernanda Montenegro e Juliana Carneiro da Cunha, entre outras. “Era a história de seis mulheres em um momento em que os sentimentos femininos não eram tão discutidos”, comenta.
A peça também traz outros grandes momentos, como quando Rafael Bacelar dialoga com a voz da mãe, que surge em gravação, para mostrar seu processo de transformação. Também o de Bianca Manicongo, atriz trans cuja potente voz marca presença em questões identitárias.
Serviço
Ao Vivo [dentro da cabeça de alguém]
Teatro do Sesi-SP – Centro Cultural Fiesp. Avenida Paulista, 1313
Quinta a sábado, 20h. Domingos, 19h.
Os ingressos gratuitos são liberados a cada segunda-feira, a partir das 8h. Podem ser reservados no site www.sesisp.org.br/eventos
Não haverá espetáculo nos dias 30 de agosto, 21, 22, 23, 24 de novembro.
Até 1º de dezembro