O evento reúne quinze espetáculos gratuitos entre os dias 6 e 15 em quatro teatros da Prefeitura
Por Dirceu Alves Jr.
Em um ano marcado pela diversidade, a Mostra Em Cena, promovida pela Secretaria Municipal de Cultura, chega a sua quinta edição entre 6 e 15 de dezembro com quinze espetáculos adultos e infantis de múltiplas temáticas. Como de costume, a programação, com entrada franca, se espalha por quatro espaços culturais da Prefeitura: os teatros Alfredo Mesquita, na zona norte, Arthur Azevedo, na zona leste, Cacilda Becker, na zona oeste, e Paulo Eiró, na zona sul. Os ingressos podem ser retirados nas bilheterias com uma hora de antecedência.
Entre os destaques adultos estão as peças Tio Vânia, dirigida por Eduardo Tolentino de Araujo, e O Que Só Sabemos Juntos, protagonizada por Denise Fraga e Tony Ramos, que tiveram sessões lotadas nas temporadas originais. “Neste ano, o nosso objetivo foi buscar um equilíbrio para valorizar o histórico de grandes artistas e apontar talentos que estão se solidificando na cidade”, explica Júlio César Dória, supervisor dos teatros da Prefeitura e curador do evento. ‘É uma amostra da diversidade do teatro paulistano e, por isso, uma busca pela valorização do teatro infantil, porque precisamos formar o público que frequentará teatro no futuro.”
Tio Vânia, montagem do Grupo Tapa baseada no clássico do russo Anton Tchekhov (1860-1904), foi sucesso entre maio e junho no Sesc Santana, na zona norte, e ganha nova chance da sexta (6) ao domingo (8), no Teatro Arthur Azevedo, na Mooca, zona leste. Com impressionante atualidade, a peça mostra a história de Vânia (interpretado por Brian Penido Ross), um homem que se descuidou da própria vida para tocar a propriedade rural da família, e discute temas como preservação das florestas, reforma agrária e a opressão feminina. No elenco, estão Zécarlos Machado, Anna Cecilia Junqueira, Camila Czerkes, Walderez de Barros e Bruno Barchesi, entre outros.
“A questão da peça é a terra tratada como um bem privado, e a disputa da família por essa terra comove as pessoas”, afirma o encenador Eduardo Tolentino de Araujo. “Há uns 30 anos, a abordagem ecológica e o fato de o personagem do médico falar que é vegetariano e colocar um discurso sobre o desmatamento pareceria talvez um blábláblá, mas hoje é de grande presença na sociedade em que vivemos e cabe trazer assuntos como estes à tona.”
Depois de duas décadas, o ator Tony Ramos voltou aos palcos em uma inspirada contracena com a atriz Denise Fraga em O Que Só Sabemos Juntos. O frisson diante do encontro desta dupla fez com que grande parte dos ingressos se esgotasse antes mesmo da estreia, no fim de abril, no Tuca, em Perdizes, e as apresentações em cidades como Rio de Janeiro, Porto Alegre e Brasília tiveram repercussões semelhantes. Desta vez, a peça ocupará o Teatro Paulo Eiró, em Santo Amaro, na zona sul, da sexta (6) ao domingo (8).
A montagem, dirigida por Luiz Villaça, reúne cenas inspiradas em temas contemporâneos para espelhar a relação de um casal em que a escuta deixou de fazer parte da rotina. “A gente sempre se preocupa em levar o nosso teatro para lugares e públicos diferentes, ainda mais nesse caso, em que muita gente não conseguiu mesmo ver por falta de ingressos, quer dizer, sempre acho que tem alguém mais que quer ver (risos)”, comenta Denise. “Gosto de mostrar nossa peça como uma criança que exibe o seu feito, seu desenho, seu presente de aniversário, porque confio que todos vão viver bons momentos ali.”
Pauta constante na cena brasileira recente, o debate em torno do preconceito racial aparece em dois espetáculos. O monólogo Parto Pavilhão, escrito por Johnny Salaberg e dirigido por Naruna Costa, é interpretado por Aysha Nascimento e ganha a cena no Teatro Alfredo Mesquita, em Santana, também neste primeiro fim de semana, da sexta (6) ao domingo (8). Na história, Aysha representa uma parteira que, devido a um descuido dos coordenadores da penitenciária, abre as celas da prisão na tentativa de oferecer liberdade para as outras mulheres.
Tão pungente quanto é a proposta de Para Meu Amigo Branco, direção de Rodrigo França, que assina a dramaturgia junto de Mery Delmond. A peça, que pode ser vista no Teatro Arthur Azevedo, nos dias 14 e 15, trata de um caso de racismo em uma escola onde uma menina preta de 8 anos é ofendida por uma colega branco. O pai da garota pede uma providência, mas o debate não encontra sintonia equivalente entre os professores e demais pais e mães. Marcelo Dias, Reinaldo Jr., Alex Nader, Stella Maria Rodrigues e a coautora compõem o elenco.
Para França, a possibilidade de fazer Para Meu Amigo Branco gratuitamente e diante de uma plateia que, muitas vezes, não tem acesso ao teatro é bom, principalmente, para as pessoas que sofrem racismo saberem que não é uma relação exclusiva ou de responsabilidade delas. “O preconceito atinge pretos e pretas simplesmente pelas suas existências já que o Brasil tem uma estrutura racista, e os brancos precisam saber que o problema do país não é de classe, mas de raça”, declara o diretor. “O que determina a forma como as pessoas vão se relacionar é o racismo e, por isso, fico feliz por ampliar o público da peça.”
Indicada ao Prêmio Shell, a atriz Noemi Marinho entrega um grande desempenho no drama O Vazio na Mala, escrito por Nanna de Castro e encenado por Kiko Marques. Na peça, que terá sessões no Teatro Paulo Eiró entre os dias 13 e 15, ela interpreta uma senhora judia, acometida pelo mal de Alzheimer. A personagem guarda segredos do passado vivido entre guerras capazes de influírem no atual momento de vida do neto (papel de Marcelo Várzea, em substituição a Emílio de Mello).
A relação entre um neto e um avô que também enfrenta o Alzheimer é o mote de Donatello, poético musical de bolso sobre a memória que precisa ser descoberto pelo público, assim como o talento de seu autor e protagonista, Vitor Rocha. Dirigida por Victoria Ariante, a montagem apresenta músicas originais de Elton Towersey e será levada no Teatro Alfredo Mesquita dos dias 13 a 15.
“Tão importante para formar público quanto a descentralização é tornar acessível as mensagens dos espetáculos porque o básico da nossa missão como artista é chegar às pessoas e ser compreendido”, afirma Rocha, que é mineiro, tem 27 anos e vive em São Paulo desde 2016. “Quero furar bolhar e vejo espectadores que voltam, levam amigos, os pais, os avós e acho que isso pode se repetir agora porque festivais como este nos possibilita chegar a lugares que não teríamos condições por conta própria e, assim, dialogar com novos públicos.”
PROGRAMAÇÃO COMPLETA
Teatro Arthur Azevedo. Avenida Paes de Barros, 955, Mooca.
Trilha para as Estrelas. Cia Barracão Cultural. Direção: Thaís Medeiros. Dias 7 e 8/12, 16h.
Tio Vânia. Grupo Tapa. Direção: Eduardo Tolentino de Araujo. Dias 6 e 7, 20h30; e 8, 19h.
Para Meu Amigo Branco. Direção: Rodrigo França. Dias 14, 18h e 21h; 15, 19h.
Joana e o Príncipe Silencioso. Grupo As Meninas do Conto. Direção: Eric Nowinski. Dias 14, 16h; 15, 11h e 16h.
Teatro Paulo Eiró. Avenida Adolfo Pinheiro, 765, Santo Amaro.
Acorda!. Grupo Esparrama. Direção: Iarlei Rangel Leal Sena. Dias 7 e 8, 16h.
O Que Só Sabemos Juntos. Direção: Luiz Villaça. Dias 6 e 7, 21h; 8, 19h.
Dinossauros do Brasil. Cia Pia Fraus. Direção: Beto Andreetta. Dias 14 e 15, 16h.
O Vazio na Mala. Direção: Kiko Marques. Dias 13 e 14, 21h; 15, 19h.
Teatro Alfredo Mesquita. Avenida Santos Dumont, 1.770, Santana.
La Trattoria. Cia Los Circo Los. Direção: Lily Curcio. Dias 7 e 8, 16h
Parto Pavilhão. Direção: Naruna Costa. Dias 6 e 7, 21h; 8, 19h.
Azul. Artesanal Cia. de Teatro. Direção: Carlos Henrique Goncalves Pinto. Dias 14 e 15, 16h.
Donatello. Direção Victoria Ariante. Dias 13 e 14, 21h; 15, 19h.
Teatro Cacilda Becker. Rua Tito, 295, Lapa.
Fábulas. Cia. Mevitevendo. Direção: Afonso Lopes. Dias 7 e 8, 11h.
A Concha. Direção: Mark Bromilow. Dias 7 e 8, 16h.
Para Mariela. Grupo Sobrevento. Direção: Luiz André Cherubini e Sandra Vargas. Dias 14, 18h e 21h; 15, 19h.