A partir do pensamento do educador Paulo Feire, artistas contam Canudos por meio do protagonismo da comunidade que construiu a vila localizada no sertão da Bahia
Por Redação Canal Teatro MF
A guerra de Canudos é um tema bastante recorrente nas artes, desde que Euclides da Cunha criou por meio da escrita em Os Sertões, um apanhado histórico e geográfico do que foi o massacre comandado pelo Exército Brasileiro à comunidade localizada no sertão da Bahia. Na literatura, o escritor peruano Mario Vargas Llosa refez a trajetória de Antônio Conselheiro, de forma romanceada, em A Guerra do Fim do Mundo. O diretor Zé Celso Martinez Correa, do Teatro Oficina, transformou a obra escrita por Euclides da Cunha em uma pentalogia, que assim como o livro, criou capítulos para narrar a terra, o homem e a luta.
Agora é a vez da Cia do Tijolo propor o seu olhar para a saga. E tirando o foco do líder conselheiro, a peça Restinga de Canudos, que estreia no Sesc Belenzinho, dá protagonismo à comunidade anônima que ergueu o povoado no sertão baiano, antes de ser arrastada para a guerra sob a liderança de Antônio Conselheiro.

“Qual a contribuição que nós, da Cia. do Tijolo, pretendemos dar ao tema? Em primeiro lugar, contar a partir da construção da Vila e não de seu massacre”, afirma o co-criador, diretor e ator Dinho Lima Flor, que explica: “Não queremos que o crime perpetrado pela recém-nascida república brasileira ofusque o lado vencedor da comunidade criada por Conselheiro e a comunidade de Canudos”.
Restinga de Canudos dá continuidade à pesquisa da Cia. do Tijolo sobre educação popular e arte como ferramentas de transformação social. Inspirada na ética do educador Paulo Freire, a Companhia reafirma a importância da pedagogia na formação da consciência crítica.
Assim como em espetáculos anteriores, manifesta-se essa vertente na figura de duas professoras, que conduzem a plateia na costura entre passado e presente. É por meio delas que Canudos é desvelado antes do conflito. Restinga expõe um outro prisma para a narrativa histórica. Para além do massacre, evidencia as origens de uma comunidade que antecede a sua luta contra um Estado opressor, demarcando suas origens e o lugar de construção de uma comunidade que antecede a luta de fato. Expõe-se assim a dinâmica cotidiana dos sertanejos, poetas populares, beatos, indígenas e ex-escravizados que estiveram na gênese, não só de um povoado, mas de um mito histórico já muito explorado pela cultura brasileira.

Segundo Dinho, o espetáculo mergulha nas águas do Açude de Cocorobó, onde submerge o sítio histórico de Belo Monte e o povoado de Canudos. “Se conseguirmos despertar a curiosidade do espectador e, no melhor dos cenários, o amor do público pela força de Belo Monte, teremos cumprido nosso intento.”
Como parte da programação do espetáculo, a companhia também irá promover o programa formativo Canudos: Além da Cena, que visa ampliar as reflexões sobre a memória e os desdobramentos históricos da Guerra de Canudos. A programação inclui encontros musicais abertos ao público, conduzidos pelo Núcleo Musical da Cia., nos quais serão trabalhadas as sonoridades e o repertório do espetáculo.
Além disso, o bate-papo Conversa a Contrapelo contará com a participação da professora e pesquisadora Silvia Adoue (Unesp e Florestan Fernandes) e do diretor e ator Cleiton Pereira (Grupo Contadores de Mentira), que discutirão as conexões entre Canudos e as lutas sociais contemporâneas.
Serviço
Restinga de Canudos
Sesc Belenzinho. Rua Padre Adelino, 1000
Sextas e sábado, 20h. Domingos, 17h. R$ 50
Até 27 de abril (estreia 14 de março)