Diante da ideia de um mundo em ruínas, duas personagens buscam a comunicação em um ambiente de muitas incertezas e sem prospecções de futuro
Por Redação Canal Teatro MF
Nesta semana, a qualidade do ar na cidade de São Paulo foi considerada a pior do mundo segundo o monitoramento da agência suíça IQAir. No primeiro semestre deste ano, as águas tomaram conta da cidade de Porto Alegre, fazendo com que muitos e muitas perdessem suas casas e uma extensa região ficasse submersa pelo excesso de chuva. O Brasil vive hoje a maior seca da história que atinge 1.400 cidades no país. Pantanal e Amazônia estão queimando diante de uma luta desenfreada para conter as chamas que não cessam.
Todas essas graves tragédias citadas, que se limitam apenas ao Brasil, somadas à muitas outras catástrofes estendidas pelo planeta, impulsionam o Relógio do Juízo Final a concluir a ideia de que o planeta vive seus últimos instantes. Esse projeto, criado em 1947 pelo grupo Atomic Scientists para alertar a população mundial sobre o quão rápido a humanidade se aproxima do fim do mundo, traz como referência, por meio de um relógio imaginário, o horário da meia noite como marco para que o planeta acabe. A cada catástrofe ambiental, pandemia, guerra ou ameaça nuclear, os ponteiros avançam alguns segundos. No entanto, decisões políticas e eventos positivos fazem o tempo retroceder. Atualmente este relógio nos diz que estamos a 90 segundos do fim.
Tendo como inspiração esse projeto – o Doomsday Clock –, o cenário do espetáculo Um Céu de Assombro, que estreia no Teatro Cacilda Becker, é um grande relógio em cena. “O nosso relógio também tem essa marca do fim do mundo à meia-noite e ele anda um pouco pra trás e um pouco pra frente durante o espetáculo. Então, ele vai mostrando, contando um pouco a história de duas personagens que estão à iminência de algo aterrorizante. A encenação traz esse futuro distópico como um distanciamento para poder criar uma reflexão”, explica o diretor e cenógrafo Kleber Montanheiro.
As duas personagens referidas por Kleber são dois estranhos que se comunicam por um rádio, em um futuro devastado. De um dos lados da linha, está um homem intelectual que passa os dias diante de um aparelho de comunicação tentando contato com a esposa que partiu. Do outro, está uma mulher soldado que busca ajuda após ter desertado e ter sido ferida pelo próprio capitão. Cada um está em meio aos destroços do que um dia foram prédios.
A distopia tão presente na realidade do mundo contemporâneo fez com que a atriz Daniela Flor idealizasse essa montagem logo após os mais de dois anos que grande parte da população mundial ficou estagnada por conta da pandemia da Covid-19.
“A peça veio de tudo o que estava acontecendo no mundo e principalmente no Brasil, de um presidente que estava sem nenhum olhar para isso, tirando sarro das pessoas que morreram, amigos próximos, familiares. E, como atriz, como artista, me veio a necessidade de transformar todos aqueles sentimentos em arte, que é a nossa função: deglutir, digerir e devolver de forma artística”, revela a atriz.
Durante a busca por uma dramaturgia que desse conta de todas essas inquietações, ela e o ator Daniel Costa procuraram o autor Daniel Veiga, que havia escrito um texto curto – Coincidente. A obra retratava um casal em situação de escombros e foi usada como disparadora para a criação de Um Céu de Assombro. “O projeto almeja relatar nosso tempo, reconstruir ruínas e unir escombros, buscando reencontrar a identidade em meio ao caos psicológico, emocional, profissional, fraterno, monetário, social e institucional”, acrescenta Daniela Flor.
Serviço
Um Céu de Assombro
Teatro Cacilda Becker. Rua Tito, 295 – Lapa
Quinta a sábado, 21h. Domingo, 19h
Ingressos: Gratuitos, disponíveis na Sympla
Até 29 de setembro (estreia 12 de setembro)
