Com dramaturgia de Luís Alberto de Abreu e direção de Paulo Fabiano, espetáculo promove diálogo entre a vida do autor negro, momentos da escrita do romance ‘Triste Fim de Policarpo Quaresma’ e uma crítica à sociedade que o marginalizou
Por Ubiratan Brasil (publicada em 16 de julho de 2025)
Mestiço, filho de pais com instrução, mas de humilde situação financeira, o escritor Lima Barreto (1881-1922), a partir da adoção de um estilo seco e direto, lutava para que a literatura fosse um meio de levar ao homem comum a mensagem de sua libertação e um estímulo para continuar lutando para o reconhecimento de todos os seus direitos fundamentais.
Dono de uma linguagem rica de comunicação e de recursos expressivos, Lima tinha a escrita como plataforma social. E, a partir de uma de suas principais obras, Triste Fim de Policarpo Quaresma que o grupo Teatro-X criou o espetáculo Lima Barreto, Ao Terceiro Dia, com dramaturgia de Luís Alberto de Abreu e direção de Paulo Fabiano.

A montagem trata do período em que o escritor e jornalista esteve em sua segunda internação no Hospício Dom Pedro II para tratar sua dependência de álcool e os problemas de saúde. A peça é um mergulho poético e visceral nos pensamentos finais do autor.
Na trama, aos 41 anos, durante o período em questão, Lima revive memórias de sua juventude e o processo de escrita de Triste Fim…, que ele publicou como folhetim no Jornal do Commercio em 1911 e, mais tarde, em 1915, foi lançado em livro em uma edição bancada pelo próprio autor. Entre delírios e a lucidez, ele fantasia encontros com os personagens que criou, como se eles próprios viessem cobrar, consolar ou confrontar seu criador. A peça ainda escancara as marcas de um Brasil racista, elitista e hipócrita que empurrou o autor à margem.
Apesar de ser o grande romancista da geração pós machadiana e pioneiro do romance moderno brasileiro, Lima via com olhar muito crítico a obra de Machado de Assis, além de ter esnobado a geração dos modernistas. Não reconhecido devidamente em sua época, Lima revelou-se um homem do futuro.

A trama da peça é narrada em três planos: o do presente, no qual vemos Lima internado compulsoriamente em 1919 por alcoolismo; o do passado, quando ele escreve sua obra-prima; e o da ficção, no qual se desenvolvem trechos da história de Policarpo e outros personagens do autor.
A ideia é propor um diálogo urgente entre passado e presente, revelando o abismo entre o gênio literário de Lima e o grave abandono e a falta de reconhecimento que ele sofreu em vida. Além disso, em consonância com a luta antimanicomial, o trabalho denuncia as internações em hospícios como forma de controle social, processo que vitimou uma massa de pessoas pretas, incluindo o próprio escritor.
Serviço
Lima Barreto, Ao Terceiro Dia
Centro Cultural Olido – Sala Sala Paissandu. Av. São João, 473
Sextas e sábados, 19h30. Domingos, 18h. Grátis (Reservas antecipadas Sympla – link: Lima Barreto ao Terceiro Dia em São Paulo – Sympla) Distribuição de ingressos a partir de 1h antes do início do espetáculo
Até 3 de agosto (estreia em 18 de julho)
