Criado por Matheus Marchetti, conto de fadas macabro tem trilha sonora original que vai do lírico ao folk-rock
Por Ubiratan Brasil
Quando adolescente, Matheus Marchetti, hoje dramaturgo e diretor, tinha um sonho recorrente em que se via em um hotel isolado e diante de um menino misterioso, pelo qual se apaixonava. Fruto de um momento em que buscava entender sua sexualidade, o sonho foi constantemente descrito em um caderno de anotações de Marchetti que, já adulto, decidiu transformar em arte.
Primeiro rodou um curta-metragem em 2017, como conclusão de curso na Faap, até que, depois de desistir de transformá-lo em um longa, criou o musical O Bosque dos Sonâmbulos, que ganha nova temporada no Teatro Viradalata.
“O texto atual foi bem modificado em relação ao primeiro que, logo percebi, tinha muito das inquietações do adolescente que eu era e que já não me preocupam mais”, conta Marchetti, que aproveitou a reclusão imposta pela pandemia para aprimorar a dramaturgia.
Novamente contou com a colaboração de Vitor Mascarenhas, amigo desde 2014 e autor das canções originais que bem ilustram o tom onírico da trama – barítono, atualmente ele se apresenta em óperas no Brasil e na Europa.
O Bosque dos Sonâmbulos acompanha os irmãos Oliver (papel dividido entre Andy Cruz e Lucas Bocalon) e Thomas (alternado por Bruno Germano e Giuliano Garutti) que viajam com os pais para um antigo hotel nas montanhas. Lá, conhecem uma misteriosa companhia de ópera, do qual se destaca Roman (inspirada interpretação de Jow Black) por quem Thomas acaba se apaixonando.
Oliver logo desconfia que, na verdade, trata-se de um grupo de vampiros, que vai colocar em perigo ele e sua família. “É um conto de fadas macabro com o qual busquei criar um romance gay adolescente que se casasse com minha linguagem narrativa de preferência, que é o horror”, conta Marchetti. “Assim, busquei inspiração nos filmes de horror gótico dos anos 1960 e 1970, principalmente os que tratam de vampiras lésbicas – como as obras de Jean Rollin -, mas subvertendo o olhar talvez mais heteronormativo dessas narrativas, trocando o gênero dos personagens centrais.”
Foram muitas as referências usadas por ele em sua criação, especialmente o filme checo Valerie e Sua Semana de Deslumbramento, dirigido por Jaromil Jires em 1970 sobre uma adolescente que percebe o despertar de sua sexualidade.
Marchetti se apoiou também em obras-primas como A Dança dos Vampiros (1967), de Roman Polanski, e Teorema (1968), de Pier-Paolo Pasolini. E, claro, o cinema onírico de Federico Fellini, especialmente Julieta dos Espíritos (1965).
Para que o público se sinta mais próximo da trama, Marchetti decidiu não usar a plateia do teatro: as pessoas se acomodam em cadeiras colocadas no formato arena no espaço atrás do palco, que será ocupado apenas pelos músicos Felipe Parisi (violoncelo), Pedro Vulpe (violão e guitarra) e Guilherme Gila (piano), também diretor musical.
A trilha original composta por Vitor Mascarenhas traz uma sonoridade agradável e variada, que vai do folk-rock à ópera, buscando recriar o sentimento de sair de um sonho e cair em um pesadelo, por exemplo.
E, se o cenário é formado por poucos objetos em cena, os figurinos trazem um colorido excessivo que, reforçado pela iluminação, ressalta o clima de sonho e pesadelo.
A narrativa começa quando um escritor (Mateus Torres) volta àquele hotel anos depois, em busca de explicações para os fatos turbulentos ocorridos no passado. E o final promete uma surpresa, que convém não divulgar aqui.
O elenco é completado por Bruna Pimentel, Beatriz Algranti, Nicole Tacques, Tony Germano, Adriano De Sidney, Giovanna Melo, Igor Patrocínio, Bruna Lemberg, Giovana Brandão, Abel Juliano, Isabella Melo e Henrique Natálio.
Serviço
O Bosque dos Sonâmbulos
Teatro Viradalata. Rua Apinajés, 1387
Terças, quartas e quintas, 21h. R$ 90
Até 12 de outubro
