Escrita pelo italiano Eduardo De Filippo, peça em cartaz no Sesc 14 Bis diverte com reflexões sobre a natureza humana
Por Ubiratan Brasil (publicada em 2 de setembro de 2025)
Considerado um dos mais importantes artistas da Itália do século passado, Eduardo De Filippo (1900-1984) usou do humor para retratar a crise da sociedade patriarcal, escrevendo comédias agridoces sobre a vida familiar italiana e, especialmente, sobre a sociedade napolitana durante e após a Segunda Guerra Mundial. “Ele caminhava entre a comédia e a tragédia com a leveza dos grandes mestres“, comenta o diretor Marcelo Lazzaratto, que há muito (20 anos) desejava montar um texto desse dramaturgo. O desejo se realizou com A Grande Magia, em cartaz no Sesc 14 Bis, peça que comemora os 25 anos da Cia. Elevador de Teatro Panorâmico.
Trata-se de um texto escrito em 1948, quando o continente europeu ainda sofria as graves consequências da Segunda Guerra Mundial. No início da trama, que se passa em um hotel de veraneio, o mágico Otto Marvuglia (interpretado por Chico Carvalho) faz a esposa de um marido ciumento “desaparecer” e ser guardada dentro de uma caixa. A mulher, no entanto, aproveita o truque para fugir com o amante. O marido, em um ato de desespero e negação, prefere acreditar que a esposa está presa na caixa, desencadeando uma jornada de reflexões que testam a natureza humana e a forma como escolhemos acreditar.

“Para o marido, é melhor que a mulher não exista do que confirmar sua condição de traído”, comenta Carvalho que, como todos no elenco, são precisos na forma de falar as palavras, todas muito bem articuladas. “Isso reforça a atmosfera de um estilo de comédia comédia que lembra o teatro de vaudeville”, observa a atriz Larissa Garcia.
O autor, de fato, no período inicial de sua carreira teatral, retratou em suas peças o estilo de vida frenética e despreocupada, que considerava os dias da juventude, da despreocupação e do otimismo. Em A Grande Magia, no entanto, De Filippo descobriu a ilusão dos acontecimentos humanos, com toda a sua amargura e desilusão. “A peça é uma ode à ilusão que nos move e, ao mesmo tempo, um alerta sobre os perigos da manipulação”, comenta Lazzaratto, que apostou em uma encenação marcada pelo humor, mas sem se esquecer da dramaticidade que marca o cotidiano de uma sociedade ainda traumatizada com uma grande guerra.

Uma comédia estruturada cerebralmente sobre os temas de Pirandello, para quem a ilusão substitui à força a realidade, como comprova o marido que quer acreditar na história absurda de sua mulher dentro de uma caixa. De Filippo reflete sobre a crise do pós-guerra e a preferência das pessoas por não encarar a realidade, utilizando a arte como ferramenta de alerta, não apenas como uma ilusão tranquilizante.
Curiosamente, a peça não fez sucesso quando estreou porque o público não a compreendeu. Acostumadas aos textos predominantemente cômicos do autor, as pessoas que presenciaram as misérias da guerra queriam se entreter com histórias populares simples e patéticas, e não com o biscoito fino oferecido por De Filippo. “Montar A Grande Magia é, sobretudo, acreditar no teatro. Na sua potência transformadora, no seu artifício essencial, no seu pacto com a imaginação”, afirma Lazzaratto, que assina a direção e adaptação do texto.
O elenco do espetáculo é completado pelos atores Carolina Fabri, Chiara Lazzaratto, Ernani Sanchez, Fernando Vitor, Gabriel Miziara, João Portela, Marina Vieira, Pedro Haddad e Rita Gullo.
Serviço
A Grande Magia
Sesc 14 Bis. R. Dr. Plínio Barreto, 285
Sextas e sábados, 20h. Domingos, 18h. Dias 4 e 11/9 (quintas), 15h. Dia 18/9 (quinta), 20h. R$ 60
Até 21 de setembro (estreou 30 de agosto)
