Sesc Belenzinho sedia o projeto Girassol de Fogo, do Grupo Ventoforte, com dois clássicos do teatro encantatório do saudoso Ilo Krugli, além de promover um ciclo de encontros, mostrando a vitalidade artística desse coletivo de 50 anos, ainda capaz de interessar as novas gerações
Por Dib Carneiro Neto (publicada em 3 de outubro de 2025)
“Nenhuma demolição é capaz de destruir a força e a importância de um Teatro.” Com essa frase, assinada por dois de seus mais fiéis integrantes, Beth Brait Alvim e Eduardo Bartolomeu, o Grupo Ventoforte anuncia que está vivo e de volta à cena, com força e coragem, após a partida de seu fundador, diretor, mentor e inspirador Ilo Krugli (1930-2019) e, pior, depois que a sede, no Parque do Povo, bairro do Itaim-Bibi, em São Paulo, foi demolida de forma truculenta por agentes escalados pela Prefeitura paulistana.
A resposta do Ventoforte à brutal tentativa de destruição de uma memória e de um patrimônio, ocorrida em 13 de fevereiro, com ampla repercussão nacional, ganhou o nome de Projeto Girassol de Fogo – Ventoforte 50 anos, aproveitando também a efeméride de meio século de atividades deste emblemático grupo, um dos pioneiros na valorização estética e temática do teatro feito para crianças e jovens no país.

“Girassol do Fogo é o nome de uma canção antiga do Ventoforte”, conta Eduardo Bartolomeu. “Uma canção simples e cativante que se tornou recorrente entre nós do Vento. Em qualquer encontro, essa canção é cantada. Refletindo sobre esse momento de retomada e renovação do Vem, encontramos nessa canção uma força que embala nossa luta e poesia em cena. Um girassol do fogo é delicado, mas intenso. Sendo o nome de uma canção, subjaz também uma mensagem: podem até demolir o prédio, mas há algo mais sútil e firme que não se derruba. As histórias, canções e ideias, que o Vento cultivou, estão vivas e em movimento.”
Assim, com esse nome poético de canção, o Projeto começou na semana passada, com a estreia – no Sesc Belenzinho, onde tudo vai se passar – da temporada de História de Lenços e Ventos, que fica em cartaz até o fim de outubro. A partir do dia 4, mais um braço da programação: a contação de História do Barquinho, atividade gratuita na área de convivência daquela unidade.
Para completar, não poderia faltar um ciclo de conversas, nas noites de 15, 22 e 29, com o título de “O Teatro e as Infâncias – Encontros sobre Poéticas possíveis e impossíveis e seus desdobramentos”. Debatedores convidados vão desenvolver ideias em torno de três tópicos: 1) O legado poético de Ilo Krugli e do Teatro Ventoforte; 2) Dramaturgia, música e crítica no teatro para infâncias; e 3) Desdobramentos e Futuro: Caminhos para o Teatro e as Infâncias e Práticas Kruglianas para a Educação.
“Eu estou engajado e encantado com nosso trabalho de tantas mãos”, comenta Eduardo. “Me alimenta a possibilidade de essas histórias se atualizarem para o nosso tempo e espaço. Fico tocado com o encontro entre gerações, que alcançamos para realizar essa ação que o Sesc encampou.” Ele fala também da saudade que sente de Ilo Krugli: “Minha saudade maior é chegar bem antes ao ensaio, dar um abraço nele e ouvir suas lembranças, acompanhar seus silêncios ou rir das rabugices e manias dele. O Ilo vive em nós, mas dá uma saudade danada também!”

Dirigido por Rodrigo Mercadante e Karen Menatti, História de Lenços e Ventos retorna aos palcos cinco décadas depois de sua criação. Montado em 15 dias, em plena ditadura militar, o espetáculo inaugurou a trajetória do Ventoforte, transformando o teatro para infâncias no Brasil e projetando a companhia internacionalmente. No metafórico enredo, Azulzinha, um lencinho azul de seda, deseja aprender a voar, mas é aprisionada pelos soldados do Rei Metal Mau, no Castelo Perfeito, onde reinam a ordem e o tédio. Com ajuda do Papel e de outros personagens, os lenços se unem para libertá-la. A peça é um hino à imaginação, à liberdade e ao quintal imemorial que o ser humano carrega em si.
Por sua vez, uma obra criada por Ilo Krugli nos anos 1960 e que completou 60 anos em cena, História de um Barquinho, narrativa que terá a direção de Luís André Cherubini, acompanha a aventura de Pingo 1º, um pequeno barco que se lança à correnteza em busca de liberdade, encantando crianças e adultos. Sozinho e ancorado – sem poder conhecer a imensidão das águas -, ele conhece a flor Irupê, muda os rumos da sua vida e vive uma viagem maravilhosa, fazendo amigos e passando por perigos.
Ilo, argentino naturalizado brasileiro, primeiro radicado no Rio, depois em São Paulo, escrevia e dirigia suas peças com a pena leve de um poeta lépido e travesso. Inundava suas criações de metáforas poderosas, dessas que desafiam a imaginação das crianças, envolvendo-as em uma atmosfera não realista do começo ao fim. Ensinou muitas gerações de artistas a valorizar o teatro pensado para as infâncias e a eliminar da dramaturgia os didatismos pobres e a obsessão pela lição de moral. Tinha hálito de beija-flor e ímpetos de rouxinol. Seu legado é de príncipe feliz, desses que não trocam praças e coretos por nenhum castelo suntuoso. Seu exemplo é o de um guerreiro incansável, lutando pela liberdade da arte.
Serviço
Projeto Girassol de Fogo – Ventoforte 50 anos
Sesc Belenzinho. Rua Padre Adelino, 1000
História de Lenços e Ventos
Duração: 75 min. Classificação: Livre
Temporada: sábados e domingos: dias 11, 12, 18, 19, 25 e 26 de outubro, 12h. Ingressos: Grátis para crianças até 12 anos. R$ 40
Contação: História do Barquinho
Duração: 40 min. Classificação: a partir de 1 ano
Temporada: sábados e domingos: dias 4, 5, 11, 12, 18, 19, 25 e 26/10/25, 16h Atividade gratuita na área de convivência do Sesc Belenzinho.
Ciclo de encontros – O Teatro e as Infâncias – Encontros sobre Poéticas possíveis e impossíveis e seus desdobramentos
O legado poético de Ilo Krugli e do Teatro Ventoforte. Dia 15, 19h
Dramaturgia, música e crítica no teatro para infâncias. Dia 22, 19h
Desdobramentos e Futuro: Caminhos para o Teatro e as Infâncias. Práticas Kruglianas para a Educação. Dia 29, 19h
