Em montagem que dá ênfase ao texto escrito há quase seis décadas, Marcelo Marcus Fonseca revisita a emblemática dramaturgia do autor santista, que expôs pessoas à margem da sociedade
Por Redação Canal Teatro MF (publicada em 29 de setembro de 2025)
A primeira vez que o texto Dois Perdidos Numa Noite Suja foi encenado trouxe o próprio dramaturgo, Plínio Marcos (1935-1999), em uma das personagens criadas pelo santista, que este ano completaria 90 anos. O ano era 1966, no início da ditadura militar no Brasil, e aconteceu no Bar Ponto de Encontro, na Galeria Metrópole, em São Paulo.
Desde então, o embate entre Tonho e Paco já recebeu muitas montagens e agora é a vez do Teatro do Incêndio apresentar o conflito entre estes dois homens. Eles estão mergulhados em uma interdependência causada pelo aprisionamento de ambos à condição de sub trabalhadores informais. Carregam caixas no mercado à espera de alguma oportunidade melhor.

Tonho veio do interior e conta com instrução, mas viu-se perdido na cidade quando seu calçado estragou e culpa essa situação por não conseguir um bom emprego. Paco, semianalfabeto e a um passo da marginalidade, é músico e teve sua flauta roubada em uma bebedeira. Ostenta um sapato novo que ganhou, exasperando o companheiro. É a necessidade de um calçado que acirra a violência entre as duas personagens.
Segundo o diretor Marcelo Marcus Fonseca, que também está em cena ao lado do ator André Pottes, “São Paulo busca esconder a miséria, e Plínio procurou tirá-la debaixo do tapete com se jogasse uma brincadeira de cabo de guerra com seu humor inusitado na pior das situações. O próprio Antunes Filho considerava Dois Perdidos Numa Noite Suja a grande obra-prima do autor”.
Fonseca completa: “Seus diálogos essenciais, ritmados, os respiros tensos, a presença do racismo, da homofobia, da misoginia no cotidiano das personagens, naturalizados numa margem social onde o que importa é viver mais um dia, são fatores que revelam a falência humana diante do poder financeiro que esmaga a consciência e a vontade, acima de tudo. Os valores se invertem. E mesmo assim são de uma beleza sonora que o grande dramaturgo orquestra entre reações de puro reflexo humano de seus heróis abatidos”.

Além da estreia de Dois Perdidos Numa Noite Suja, diversos artistas se reunirão nesta segunda-feira, dia 29, quando Plínio completaria 90 anos, em um encontro para celebrar sua vida e a obra. O evento, idealizado pelo filho do dramaturgo, Kiko Barros, acontecerá no Teatro de Arena Eugênio Kusnet para destacar a força e a atualidade da obra de Plínio, reunindo intervenções artísticas, leituras, música e depoimentos que mantêm viva sua presença provocadora e sensível. A entrada é gratuita, pede-se uma contribuição voluntária.
Serviço
Dois Perdidos Numa Noite Suja
Teatro do Incêndio. Rua Treze de Maio, 48
Sábado, domingo e segunda, 20h. R$ 40
Até 3 de novembro (estreia em 29 de setembro)
