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Em “Voar É o que me Põe de Pé”, Olívia Araújo propõe um olhar para a poesia da vida

Sinopse

Sob a direção de Renato Farias, o solo, que estreia no Teatro Vivo, funde os poemas de Geni Guimarães e a prosa de Marcelino Freire  

Por Dirceu Alves Jr.

Uma poeta sem livros, aquela que vê beleza nas coisas mais simples do cotidiano e decifra a inspiração mesmo nas memórias ruins que possam ser ressignificadas pelo tempo. Na pele desta personagem, a atriz Olívia Araújo, de 51 anos, propõe a quebra da quarta parede para comover o público no solo Voar É o que me Põe de Pé, que estreia nesta quarta, 9, no Teatro Vivo, em São Paulo. “A poesia que esta mulher enxerga e entrega aos outros é a vida que passou diante dela”, explica a intérprete.  

O espetáculo, com direção e dramaturgia de Renato Farias, é inspirado em poemas de Geni Guimarães, autora paulista de 77 anos, com dez livros publicados, e na prosa do escritor pernambucano Marcelino Freire, de 57 anos, a partir do conto Ensaio sobre a Poesia, do livro Bagageiro. Em um palco despido de qualquer cenário físico, a protagonista é vista sob a luz desenhada por Cleber Eli em uma encenação sensorial que valoriza memórias e aromas, como o do café. “É tudo pensado para o público imaginar as histórias de quem aprendeu a entender a vida e os sinais do tempo.” 

Olívia Araújo em Voar É o que me Põe de Pé. Foto Guilherme Lima

Olívia chega ao Teatro Vivo com a experiência de um ensaio aberto que considerou como uma pré-estreia. No último dia 29, a atriz participou da primeira edição do Miacena – Mostra Internacional de Artes Cênicas em Espaços Não Convencionais e Alternativos. A apresentação, no Centro de Referência da Dança (CRD), no Anhangabaú, serviu de primeiro contato com uma plateia. Antes, ela só conhecia a reação de amigos chamados para acompanhar os ensaios. “Conto a história olhando para o espectador e queria entender se aquilo poderia deixá-lo receoso ou desconfortável”, diz. “Mas imagino que criamos uma intimidade com afeto, porque ali tínhamos pessoas sem qualquer informação do trabalho.”   

Em 2004, Olívia já tinha levado ao palco doze contos de Marcelino Freire no espetáculo A Voz do Povo É a Voz do Zé, dirigido por Alberto Guzik e Wilma de Souza. Trancada em sua casa, na pandemia, ela pensou em uma adaptação on-line da mesma peça para um projeto do Teatro Vivo. Por sugestão do próprio escritor, porém, correu atrás da obra de Geni Guimarães, de quem nunca tinha ouvido qualquer referência, e ficou encantada. “Se Marcelino, que é meu amigo de tantos anos, fala, eu obedeço e faço”, afirma. “A poesia de Dona Geni é de uma simplicidade incrível que traduz o que é ser brasileiro.”

Olívia Araújo em outra cena de Voar É o que me Põe de Pé. Foto Guilherme Lima

A bem-sucedida experiência digital rendeu o desejo imediato de levar a peça para o modelo presencial. O pós-pandemia de Olívia, no entanto, foi tão intenso que só agora houve espaço na agenda. A atriz emendou uma participação na novela Além da Ilusão com o especial Falas Negras, ambos na Rede Globo, e a peça A Cerimônia do Adeus, dirigida por Ulysses Cruz, que cumpriu temporadas em 2023 em São Paulo e no Rio de Janeiro.   

Na novela Fuzuê, exibida pela Globo no horário das sete, entre agosto passado e março deste ano, a artista viveu uma das personagens centrais, Maria Navalha. O papel, cogitado para Glória Pires, Dira Paes e Isabel Teixeira, acabou em suas mãos, e Olívia enxerga na escalação um salto na questão da diversidade na teledramaturgia. “As emissoras e os produtores de elenco começaram a entender que a beleza do brasileiro está na pluralidade e o povo gosta de ver gente parecida com ele na televisão”, afirma. “O Brasil é um país jovem e demorou a perceber que nós, pretos, assim como os orientais e os povos originários, precisam ser representados em todos os setores.”

Cena de Voar É o que me Põe de Pé com Olívia Araújo. Foto Guilherme Lima

Voar É o que me Põe de Pé ganha o palco sem qualquer patrocínio ou lei de incentivo. Olívia bancou a produção com recursos próprios e aposta no retorno de bilheteria. A artista não se sente ameaçada pelo risco e sabe que é assim que funciona a carreira escolhida há três décadas. “Como a maioria das profissões, ser artista exige vocação porque as agruras são muitas, o mercado é tremendamente instável e você vive momentos ótimos e outros em que nada acontece”, declara. “Já vi amigos talentosíssimos desistirem porque não aguentaram a instabilidade, então o fato de eu persistir já me faz uma profissional realizada.”  

Assim como a personagem de Voar É o que me Põe de Pé, Olívia parece enxergar beleza no cotidiano e, mesmo nas fases em que falta trabalho, aprendeu a não se queixar. “Quando se gosta do que faz, tudo é diferente e sei disso porque vejo tantas pessoas com salários milionários e infelizes”, observa. Para ela, o grande desafio do espetáculo é fazer o público entender o que está dito nas entrelinhas e, assim, este estado de poesia pode se espalhar e ser observado no dia a dia de cada um. “A poesia está na vida que passa por nós todos os dias e não só na arte, mas no jornalismo, na medicina, na gastronomia, na arquitetura”, compara. “É só pensar no Oscar Niemeyer e na arquitetura do Copan, o que são aquelas ondas se não o resultado da sua inspiração poética?”  

Serviço

Voar É o que me Põe de Pé

Teatro Vivo. Avenida Doutor Chucri Zaidan, 2460, Morumbi

Terça e quarta, 20h. R$ 80

Até 27 de novembro (estreia 9 de outubro)

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Ficha Técnica

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Serviço

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